Durante anos, já saturado e esgotado pelos serviços de péssima qualidade prestados pelo Estado, principalmente na área da saúde, não raro transferi essa legítima insatisfação à pessoa do médico, do enfermeiro e do funcionário do hospital ou do posto de saúde em que busquei atendimento.

Essa personificação da culpa é inconsciente e natural, pois o Estado não é uma pessoa humana, não está ali para que possamos protestar. E assim como eu, a avassaladora maioria da população imputa ao servidor as mazelas que têm sua origem na má gestão do dinheiro público.

Há décadas, os problemas se acumulam, ou com estruturas físicas caindo aos pedaços, falta de pessoal, profissionais que não recebem treinamento e reciclagem adequadas, ou falta de medicamentos e materiais básicos, tais como uma aspirina, gaze ou esparadrapo.

Esquecemo-nos, assim, que a maioria daquelas pessoas que estão ali para nos atender estão fazendo um esforço hercúleo para que o mínimo nos seja garantido.

Atualmente, o servidor público da área da saúde é o pedreiro trabalhando sem tijolo, brita e pá, é o advogado que entra no escritório e se depara com o computador quebrado, sem internet, é o professor que entra na sala de aula e não encontra giz ou sequer um quadro negro em condições de uso.Ainda assim, o médico busca prestar alguma assistência, por menor que seja, para garantir àquele doente um mínimo de dignidade.

A celeuma maior surge quando essa assistência não é suficiente e o paciente ou sua família imputam ao médico servidor a culpa pelo resultado esperado, mas não atingido. Quando isso acontece, o médico se vê réu em ações judiciais nas quais os pedidos, quase em sua totalidade, são de indenizações por supostos danos morais e materiais. Ocorre que o médico servidor público não é, ou não deveria ser, parte legítima para figurar no outro polo dessas ações.

Recai sobre a Administração Pública, sobre o Estado, a responsabilidade objetiva para responder essas ações judiciais, ou seja, são os Estados da Federação ou o Distrito Federal os únicos que devem compor a lide com o Autor ou sua família.

Caberia ao Estado, em tese, no máximo buscar reparar uma eventual condenação em ação regressiva contra o seu servidor, mas o médico jamais deveria responder o processo em litisconsórcio passivo com esse mesmo Estado. É o que prevê, inclusive, a nossa Constituição Federal em seu artigo 37, § 6º.

A população, ao buscar o atendimento de saúde nos postos e hospitais, não procura pelo médico específico. Ela busca o socorro, o suporte do Estado.

Como preposto desse mesmo Estado, o médico que está ali na linha de frente não interferiu na escolha do doente ou da família na busca pelo nosocômio mais próximo e essa busca também não se deu por conta de qualquer relação de confiança estabelecida entre o médico e o Autor/família, como ocorre com os médicos particulares.

A relação que se estabelece, portanto, é entre paciente/família e Estado. O serviço é prestado pelo hospital público e os servidores públicos que ali empregam seus esforços são meros prepostos, agentes.

Daí porque não se pode falar em vínculo obrigacional entre o paciente e o médico, mas sim em responsabilidade objetiva estatal e absoluta ilegitimidade passiva do médico servidor público para figurar no polo passivo da demanda judicial. Caberia ao Magistrado observar isso de plano e já determinar, tão logo ajuizada a ação, a emenda da petição inicial com vistas à exclusão do médico servidor público do polo passivo da ação, mas infelizmente ainda não são todos os Juízes que adotam essa diligente conduta. Alguns ainda permitem que o médico responda a demanda com o Estado. E essa condução permissiva do processo judicial, evidentemente, traz ao atendimento público prestado pelos servidores da área da saúde consequências relevantes, pois a atenção e esforços dedicados ao paciente foram conferidos enquanto agentes estatais e os servidores respondem com sua honra e patrimônio pessoal por um serviço que só não foi prestado com excelência por responsabilidade única e exclusiva do Estado, que não destaca verba, atenção, cuidado e empenho suficientes para a pasta da saúde pública.

Ao se ver, como pessoa física, e não mais como servidor, arrolado como réu em processo judicial, o médico passa a ter uma conduta mais retraída no atendimento ao público, o que não deveria acontecer. O foco do servidor, do profissional médico, deveria ser dedicar o melhor atendimento possível, mas como dito, isso fica prejudicado pela preocupação em não se deixar envolver com o caso a ponto de lhe ser atribuída uma culpa inexistente. Evidente que existem exceções e que, como em todas as profissões, há o médico negligente, imperito e imprudente. Contudo, essa responsabilização do servidor deve se dar em momento distinto.Uma vez condenado o Estado a arcar com indenizações por imperícia, negligência e/ou imprudência do médico, cabe a ele processar o seu servidor em ação regressiva.

Essa justa condução do processo proposto pelo paciente ou pela família, a saber a exclusão do médico do polo passivo da demanda por ilegitimidade passiva para figurar no polo passivo, traria ao martelo do Poder Judiciário apenas e tão somente aqueles médicos efetivamente responsáveis pelo dano causado, e não mais aqueles que agiram com perícia, diligência e prudência, mesmo em péssimas condições de trabalho.

 
Fonte: por Rafael Teixeira Moreti - Advogado da Advocacia Riedel
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