Em 8 de outubro de 2025, o Supremo Tribunal Federal formou maioria para vedar a aplicação de reajustes por faixa etária a beneficiários com 60 anos ou mais, ainda que os contratos de planos de saúde tenham sido firmados antes da vigência do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003). O julgamento, ocorrido no Recurso Extraordinário nº 630.852, com repercussão geral reconhecida (Tema 381), constitui um divisor de águas na tutela dos direitos da pessoa idosa e na regulação das relações de consumo no setor de saúde suplementar.
A discussão teve início a partir de um contrato firmado em 1999 entre uma consumidora e uma operadora de plano de saúde. Ao completar 60 anos, em 2005, a beneficiária teve sua mensalidade reajustada com base em cláusula contratual que previa aumento conforme a mudança de faixa etária. A Justiça do Rio Grande do Sul considerou o reajuste abusivo, aplicando a vedação do art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, que proíbe discriminação em razão da idade.
A operadora interpôs recurso extraordinário ao STF, sustentando que a aplicação do Estatuto do Idoso a um contrato firmado antes de sua vigência violaria o ato jurídico perfeito e a segurança jurídica, garantidos pelo art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal. O cerne da controvérsia, portanto, residia em determinar se normas protetivas de ordem pública poderiam incidir sobre efeitos futuros de contratos anteriores à lei.
Por maioria de sete votos a dois, o Plenário do Supremo acompanhou o voto da relatora, ministra Rosa Weber (hoje aposentada), que negou provimento ao recurso da operadora. O entendimento vencedor consolidou-se na seguinte tese:
“A garantia constitucional do ato jurídico perfeito não elide a incidência da Lei 10.741/2003 – a vedar a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade -, quando o ingresso em faixa etária diferenciada for posterior à vigência do denominado Estatuto do Idoso (1º.1.2004), ainda que se trate de contratos de plano de saúde anteriormente firmados.”
A relatora destacou que o Estatuto do Idoso é norma de ordem pública e de aplicação imediata, alcançando relações contratuais de trato sucessivo. Dessa forma, embora o contrato tenha sido celebrado antes da lei, seus efeitos posteriores à entrada em vigor devem se conformar às novas regras protetivas.
O presidente do STF, ministro Edson Fachin, decidiu postergar a proclamação formal do resultado, aguardando o desfecho da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 90, de relatoria de Toffoli. Essa ação, ajuizada pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg), questiona se o art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso poderia alcançar contratos anteriores à norma.
Com a fixação da tese no Tema 381 da repercussão geral, o STF definiu que nenhum contrato pode prever reajuste de mensalidade em razão da idade após os 60 anos, ainda que celebrado antes de 2004. O efeito vinculante da decisão alcança todos os processos judiciais em curso sobre a matéria.
Os consumidores que sofreram aumentos indevidos poderão buscar judicialmente:
- a suspensão do reajuste abusivo,
- a adequação do valor da mensalidade, e
- a restituição dos valores pagos a maior, observada a prescrição quinquenal.
O entendimento do STF reforça a compreensão de que o envelhecimento não pode ser tratado como fator de risco mercadológico, mas como realidade social protegida constitucionalmente.
Dra. Nathália Vasconcelos
