A proposta de Reforma Administrativa que volta a ganhar força no debate político traz uma promessa tentadora: simplificar e unificar a estrutura de remuneração do serviço público. Mas, por trás do discurso de modernização e equilíbrio fiscal, o que se desenha é um modelo que pode significar o maior retrocesso nas carreiras públicas das últimas décadas.
Um dos pontos centrais é a criação de uma tabela remuneratória única por ente federativo União, estados e municípios. A ideia é que, em até dez anos, cada ente tenha uma única tabela com piso equivalente ao salário mínimo e teto vinculado ao maior vencimento daquele ente. À primeira vista, soa como uma medida de justiça e transparência. Mas, ao analisar com mais cuidado, percebe-se o real impacto: a perda da autonomia das carreiras e o enfraquecimento da valorização profissional.
Pela proposta, as atualizações dessa tabela não seriam automáticas. Ou seja, os reajustes dependeriam de nova lei, sujeita a critérios políticos e orçamentários, esse ponto e que devemos ter muita atenção, pois, a progressão está condicionada a esses critérios. Na prática, isso congela os salários e impede a recomposição das perdas inflacionárias algo que, com o passar dos anos, resulta em achatamento salarial e redução do poder de compra dos servidores, aqui no DF temos essa realidade com os servidores que optaram pela aposentadoria com paridade com o servidor público da ativa, lembrando que nesses casos em especifico os cargos foram extintos, mantendo assim o “congelamento” da aposentadoria. O resultado é simples: o servidor ganha cada vez menos, enquanto o custo de vida só aumenta.
E não para por aí, a proposta também extingue benefícios históricos, como triênios, anuênios e licenças-prêmio, mecanismos que sempre funcionaram como reconhecimento à dedicação e à permanência na carreira. A proposta prevê ainda a proibição do aumento de remuneração ou de parcelas indenizatórias com efeitos retroativos, inclusive por meio de lei, e, ainda, da progressão ou promoção exclusivamente por tempo de serviço, sendo assim, a progressão baseada apenas no tempo de serviço seria eliminada, substituída por avaliações de desempenho que, na prática, podem se tornar instrumentos de pressão e controle político. Até mesmo os adicionais de insalubridade e periculosidade seriam limitados, atingindo diretamente categorias que arriscam a vida ou a saúde no trabalho, como profissionais da saúde, da segurança e da fiscalização.
O discurso oficial é de racionalização dos gastos e eficiência administrativa, mas a verdade é que se trata de uma política de austeridade travestida de modernização. O Estado quer economizar às custas de quem mantém os serviços públicos funcionando — professores, médicos, policiais, servidores administrativos, técnicos e tantos outros que garantem o atendimento à população.
E uma vez que a tabela estivesse em vigor, acabaria com o tratamento diferenciado de categorias nas negociações salariais a depender do nível de organização ou pressão de cada sindicato, o que acaba ampliando desigualdades. O reajuste seria único para toda tabela, e não individualizado por cada carreira.
Ao retirar direitos e limitar reajustes, o governo não está apenas cortando despesas; está desvalorizando o serviço público como um todo. O efeito é perverso: carreiras menos atrativas, fuga de talentos e desmotivação entre os que permanecem. A sociedade, por sua vez, sente o reflexo direto na qualidade dos serviços prestados.
Em vez de atacar o servidor, a verdadeira reforma deveria mirar na gestão, buscando eficiência sem abrir mão da valorização profissional. Não se trata de defender privilégios, mas de garantir condições dignas para quem serve ao país.
Afinal, não há Estado forte com servidores enfraquecidos. E uma tabela única sem reajuste, sem incentivos e sem valorização não é modernização é o caminho mais rápido para a precarização ainda mais do serviço público.
