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O Dano Moral Reflexo ou em Ricochete: Conceito, Aplicação e Jurisprudência

O dano moral reflexo, ou dano em ricochete, configura-se quando o sofrimento ou abalo moral atinge indiretamente terceiros ligados à vítima direta de um ato ilícito. Esse tipo de dano, amplamente reconhecido no ordenamento jurídico brasileiro, vem sendo objeto de análise detalhada pela jurisprudência tanto do Tribunal Superior do Trabalho (TST) quanto do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ambos os tribunais têm reafirmado a possibilidade de compensação em casos de prejuízo emocional e psíquico experimentado por familiares ou pessoas próximas à vítima direta de acidentes de trabalho ou outros eventos danosos. O presente artigo explora os elementos essenciais do dano moral reflexo, discutindo sua configuração, requisitos e embasamento na jurisprudência trabalhista e cível.

1. Conceito e Características do Dano Moral Reflexo

O dano moral reflexo, também conhecido como “dano em ricochete”, é aquele que atinge um terceiro em razão de um sofrimento direto imposto a outra pessoa. Ou seja, os efeitos do ato ilícito “ricocheteiam” para além da vítima imediata, alcançando outras pessoas que possuem uma relação estreita, de caráter familiar ou afetivo, com a vítima direta. Esse dano é comumente observado em casos de acidentes graves ou fatais, onde os parentes próximos da vítima – cônjuges, filhos, pais – experimentam sofrimento e abalo emocional intensos em razão do ocorrido.

A doutrina e a jurisprudência reconhecem o dano moral reflexo como uma categoria de reparação autônoma. Para o STJ, o dano moral reflexo é reparável sempre que presente um prejuízo anímico profundo e duradouro em terceiros diretamente afetados pelo dano sofrido pela vítima primária.

Em voto proferido no julgamento do Recurso Especial nº 1.208.949 – MG, a Ministra Nancy Andrighi afirma, in verbis:

Assim, são perfeitamente plausíveis situações nas quais o dano moral sofrido pela vítima principal do ato lesivo atinjam, por via reflexa, terceiros como seus familiares diretos, por lhes provocarem sentimentos de dor, impotência e instabilidade emocional. É o que se verifica na hipótese dos autos, em que postulam compensação por danos morais, em conjunto com a vítima direta, seus pais, perseguindo ressarcimento por seu próprio sofrimento, decorrente da repercussão do ato lesivo na sua esfera pessoal, eis que experimentaram, indubitavelmente, os efeitos lesivos de forma indireta ou reflexa, como reconheceu o Tribunal de origem, ao afirmar que, “embora tenha sido noticiado na exordial que o acidente não vitimou diretamente os pais da vítima, os mesmos apresentam legitimidade para pleitearem indenização, uma vez que experimentaram a sensação de angústia e aflição gerada pelo dano à saúde familiar” (e-STJ fl. 187).

2. Jurisprudência do TST sobre o Dano Moral Reflexo

O Tribunal Superior do Trabalho reconhece o dano moral reflexo em contextos de acidente de trabalho com repercussão grave ou fatal. O TST compreende que, em situações de perda de um ente familiar em razão de acidente laboral, o sofrimento causado aos dependentes diretos da vítima configura dano moral passível de compensação. 

Tal discussão ficou em evidência em decorrência do desastre ocorrido em Brumadinho/MG e região, onde várias ações trabalhistas foram ajuizadas onde parente e pessoas próximas das vítimas desse acidente de trabalho buscaram a reparação dos danos sofrido pela perda de pessoas próximas.

Em recente acórdão, a 8ª Turma do TST consolidou o entendimento de que “o dano reflexo ou em ricochete é definido pelo prejuízo sofrido por pessoa próxima ligada à vítima imediata do ato ilícito” e que “familiares que não pertencem ao núcleo familiar básico da vítima, como tios, primos e sobrinhos, o direito aos danos morais reflexos é devido apenas se comprovada a existência de relação íntima de afeto”.

Nesse julgado, o Tribunal entendeu que o dano moral reflexo surge da perda familiar e do sofrimento indireto de parentes próximos, especialmente aqueles que conviviam diretamente com o trabalhador falecido.

Importante destacar que o TST entende que o dano moral reflexo se aplica também a lesões graves, onde o trabalhador sobrevive, mas fica incapacitado ou com sequelas permanentes. Em tais casos, o Tribunal tem reconhecido que o impacto emocional nos familiares, devido à necessidade de adaptação e cuidados contínuos, justifica a reparação do dano moral em ricochete.

3. Elementos Necessários para a Configuração do Dano Moral Reflexo

Para que o dano moral reflexo seja configurado, a jurisprudência do TST e do STJ exige os seguintes requisitos:

– Vínculo de Proximidade e Afetividade: Deve existir uma relação familiar ou afetiva próxima entre a vítima direta e o terceiro que sofreu o dano em ricochete. Esse vínculo geralmente é comprovado em relações de parentesco, como pais, filhos, cônjuges ou parceiros afetivos, como companheiros e noivos.

– Demonstração do Sofrimento: É necessário comprovar o sofrimento psíquico ou emocional significativo do terceiro. A jurisprudência entende que, em casos de morte ou lesões graves, esse sofrimento é presumido, dado o impacto dessas ocorrências em parentes próximos.

– Nexo de Causalidade**: Deve haver uma conexão clara entre o ato ilícito que atingiu a vítima direta e o sofrimento reflexo do terceiro. Esse nexo é fundamental para configurar o direito à indenização, pois demonstra que o dano foi um efeito secundário, mas direto, do ato lesivo primário.

4. Conclusão

A jurisprudência brasileira reconhece amplamente a possibilidade de reparação do dano moral reflexo ou em ricochete. Tanto o TST quanto o STJ defendem que familiares e pessoas com laços estreitos de afeto têm direito a compensação quando sofrem abalo emocional em decorrência de um dano infligido diretamente a outrem. Esse entendimento reforça a tutela da dignidade e do bem-estar psicológico dos indivíduos indiretamente afetados, garantindo que o ordenamento jurídico promova a reparação integral dos prejuízos emocionais sofridos.

O dano moral reflexo é, portanto, um instituto que visa preservar os direitos dos terceiros indiretamente atingidos, trazendo justiça e reconhecimento ao sofrimento daqueles que, mesmo não sendo vítimas diretas, são profundamente afetados pelos danos causados a seus entes queridos. A aplicação desse conceito em contextos de acidentes de trabalho e outros eventos danosos reafirma a função social e humanitária do Direito Brasileiro, que se preocupa em proteger não apenas os direitos dos diretamente lesados, mas também daqueles que sentem os reflexos do dano.

Dr. Carlos Hernani Dinelly Ferreira

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